sábado, 28 de maio de 2016

Vens ou não dá?



Foto: Mila Lyumila



Falo-te do rio

que banha a rosa escondida

debaixo do vestido

que (não) trago .

Neste caso,

este poema não será

seco.

 

Resisto ao grito

amordaçado

entre as pernas

mas não dá.

 

Há a água cega

que escorre

para não alimentar

os lábios.

 

Fico mais nua.

Menos desarmada.

 

Acordam os sons adormecidos

no jardim

e na pausa mais funda

rompe a colcheia

da intimidade.

 

Existimos em 3 D:

em via livre ou

entre quatro paredes.

 

Uma alternativa

é arranjar um

quarto na hora.

Não demores muito.

Espero-te agora

de mim fora.

 

Temos um terço no quarto.

Rezamos?

Nesse caso,

só temos 5 minutos.

 

Vens ou não dá?

domingo, 22 de maio de 2016

Não adormeças



Este poema

Está cheio de nada.

 

Pensas como

sou por dentro

e eu digo-te que

a casa está vazia.

 

Tem apenas três quartos.

Um em cada hora.

Ora, não é muito.

É impar.

 

É difícil ficar.

É mais fácil vir(-me).

 

Se me visitares,

fica do lado de dentro.

Eu ver-te-ei

do lado de fora.

 

Pisarei as pedras

que vibrarão

com o calor do corpo.

Só me resta

ficar nua.

 

Arrebentaram-me as águas

nas mãos.

Nasce o fruto do desejo

construído no silêncio

do grito que dei.

 

Parti todos os espelhos

da casa pois há

reflexos inexplorados

na claridade das horas.

 

Por isso,

mesmo sem nada,

não adormeças.

terça-feira, 17 de maio de 2016

Queres uma maçã?



Foto: Alexander Motylev

Não falo para as paredes

sobre as coisas do corpo.

Não sou feita de pedra.

Sou feita de carne e osso.

 

Irreconhecível.

Irresistível.

 

Deixaste-me sem direção

quando desfizeste

as curvas em contramão.

 

Nada disto é terreste.

Vamos navegar?

 

Mantivemos a língua

nas bocas.

Queres falar sobre isso?

 

Entreguei-te tudo

até ficar sem a roupa do corpo.

Fiquei pobre.

 

Subiu-se o mastro.

Içamos velas sem pano.

 

Navegamos em rio aberto

com suor,

sangue a pulsar,

sem lágrimas.

 

Íntima travessia

em que deslindas

todas as rotas.

 

Foram pedaços

de mau caminho

que se descobriram.

sem tormentas.

 

Apenas abraça (deiras),

não correntes.

Nelas navegamos nós.

 

Colho o fruto maduro

que me cai nos lábios.

 

Dá-me as tuas

mãos de liberdade.

 

Somos apenas fantasmas

em lençóis despidos,

ocultos pelo desejo

do fruto proibido.

 

Afinal,

o coração não é direito

pois ocupa o lado esquerdo

do peito.

 

Queres uma maçã?

sábado, 7 de maio de 2016

Ponto de colisão





Desembaraças o meu cabelo

de palavras.

Entranço o cabelo de desejos.

Sabias que os prendi

com elásticos?

Dizem que eles vêm e vão.

Estão bem apertadinhos

nos poros da pele

que aconchegas na palma da mão.

 

Empresto-te o beijo

que tenho selado nos lábios

e mato-te a vontade

só para poder enterrar-te

bem fundo no mar.

Sabes nadar?

 

Sabes,

ninguém nos conhece

e os sentidos emprestam

fogueiras aos olhos parados.

 

Viro-te as costas.

Sei que gostas

de ler

poemas ocultos.

 

Fico em ponto morto.

Mordo o lábio.

Aquece-me as mãos

pela calada.

Sem uma única palavra.

Apenas res(sus)pira.

 

É este o ponto de colisão.

Despistaste-te?

 

domingo, 1 de maio de 2016

O que fazes aqui?




O que fazes aqui?

Não te esperava tão cedo

e o tempo foge.

Corremos?

 

Poderia falar-te de uma mulher

que é uma viúva negra

bem casada com os passos que se dão.

Aceleramos nas retas

e nas curvas andamos sem travão.

 

Afinal anda tudo bem

mesmo a circular em contramão.

 

Ninguém se afasta.

Apenas sai do trilho.

Encosta na berma

para obter consolo.

 

Não há paredes

a quem me possa confessar.

Sou uma pecadora.

Não há volta a dar.

 

Assim não te falo de céu

pois ando na terra.

Não te falo de boias.

Não tenho salvação.

 

O que fazes aqui?

Não tens muito por onde navegar.

Gosto do que é impar

Por isso não me olho ao espelho

Para não me ver a dobrar.

 

O que fazes aqui?

Agora que estacionaste

no meu colo,

chegaste a um beco sem saída.